Além das muitas vantagens que o hidrogénio oferece para a indústria e para a produção e rentabilização de energia, também nos transportes deverá ter um papel a desempenhar. O H2 será um dos principais ‘motores’ do futuro, principalmente para os segmentos mais dependentes dos combustíveis fósseis.
Aviação, transporte marítimo, ferrovia e transporte rodoviário de longas distâncias. São estes os quebra-cabeças da eficiência energética em termos de transportes, e é nestes quatro segmentos que reside uma das maiores esperanças para o hidrogénio. “É o indicado para estes casos ‘difíceis de mobilidade, diretamente ou a partir de derivados”, acredita António Vidigal, da EDP Inovação, destacando que na aviação “os combustíveis sintéticos verdes poderão vir a ser dominantes”.
Pedro Valverde, manager de Cleaner Energy da empresa do grupo EDP, acrescenta que “com a tecnologia de baterias que existe hoje em dia, não é possível eletrificar” esse tipo de transportes, sendo a solução do hidrogénio ainda mais importante.
Portugal acolhe testes de H2 em comboios
Espinho e Sernada do Vouga estão separadas pelos 61 km de uma linha sinuosa de comboio, que segue o percurso do rio Vouga. O troço que liga as duas localidades do distrito de Aveiro é o que sobra de uma rede regional portuguesa que chegou a ter 177 km. Foi perdendo extensão e o seu futuro tem sido ameaçado nos últimos anos, mas a conversão das automotoras a diesel em hidrogénio pode catapultar este comboio para a modernidade tecnológica.
O ‘Vouguinha’, como é conhecido o comboio, é apenas um dos exemplos do que se espera que o hidrogénio possa trazer ao setor dos transportes a nível mundial. A CP - Comboios de Portugal, que lidera o projeto H2Rail, pretende fazer os primeiros testes em 2023. E está ainda envolvida numa outra iniciativa, a FCH2Rail que pretende testar o hidrogénio em linhas transfronteiriças com automotoras elétricas. A ideia é usar um sistema híbrido, com células de hidrogénio para gerar energia elétrica onde a linha de comboio não estiver eletrificada.
Aviação e transportes marítimos atentos
Nos últimos anos a aposta na promoção de veículos elétricos já levou a uma mudança profunda na forma como as pessoas encaram a mobilidade, seja em termos de veículos particulares e familiares ou na condução partilhada. Mas além do comboio - que poderá ter no hidrogénio uma solução de substituição onde a energia elétrica não chega -, também nos transportes rodoviários pesados, na aviação e na navegação marítima o H2 é o caminho.
“A mobilidade é uma das atividades mais poluentes, pelo que a substituição dos combustíveis fósseis por alternativas limpas é fundamental”, avança António Vidigal. Para o responsável, “a utilização do hidrogénio é uma esperança nos segmentos em que a utilização do veículo elétrico não seja a melhor solução, como o transporte rodoviário pesado de longo curso, ou veículos que operam continuamente”.
“A mobilidade é uma das atividades mais poluentes, pelo que a substituição dos combustíveis fósseis por alternativas limpas é fundamental”.
António Vidigal
Na aviação, que representa milhões de litros de combustível gastos por dia, e a necessidade de energia suficiente para percorrer milhares de quilómetros, as companhias também estão de olhos postos no hidrogénio. “Veja-se o exemplo da Airbus”, lembra João Nicolau, Hydrogen projects head da EDP, “que apresentou recentemente três conceitos de aviões com propulsão baseada em H2 como solução para utilização comercial até 2035”.
E no transporte marítimo, que às distâncias longas junta cargas extremamente pesadas, também “já há vários projetos em desenvolvimento a utilizar o hidrogénio como combustível”.
O hidrogénio na Europa de 2050
A revolução do H2 na Europa tem na mobilidade e nos transportes um dos seus elementos-chave e as expetativas são elevadas. Nuno Filipe, project manager do EDP NEW, destaca a estratégia Hydrogen Roadmap Europe, que prevê que as estradas e linhas de comboios europeias vão ser muito diferentes em 2050, o ano da neutralidade carbónica:
- 42 milhões de automóveis ligeiros movidos a hidrogénio
- 1,7 milhões de camiões
- 500 mil autocarros
- 5.500 comboios
Essa estimativa inclui também 52 milhões de habitações com sistemas de aquecimento à base de hidrogénio e 5,4 milhões de empregos criados.
Nuno Filipe lembra ainda que, em termos europeus, segundo as estimativas do mesmo documento, o H2 “poderá representar cerca de 24% do total de procura energética em 2050”, e outro estudo prevê uma procura de 16% a nível mundial para o hidrogénio.
Na mobilidade ligeira e para as necessidades domésticas, João Nicolau vê a energia elétrica como uma melhor solução, mas acredita que “a concorrência entre tecnologias é benéfica, já que promove o desenvolvimento e a inovação tecnológica”.
“O hidrogénio poderá representar cerca de 24% do total de procura energética em 2050”.
Nuno Filipe, project manager da EDP NEW
E tanto o H2 como a eletricidade vão precisar de infraestruturas e redes de abastecimento. “É fundamental para que possa haver a adoção massiva dos veículos alimentados por bateria e por hidrogénio”, refere João Nicolau. A oferta e a procura devem incentivar-se mutuamente, e no futuro poderemos vir a ter estações de serviço com carregamento de eletricidade e abastecimento de hidrogénio tal como hoje temos gasóleo, gasolina ou GPL. “A par da substituição de estações de serviço assistiremos a alterações nos modos de abastecimento”, remata.