A qualidade do ar
Todos os anos, 4,2 milhões de pessoas morrem em resultado da exposição continuada à poluição atmosférica, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). Outros 3,8 milhões sofrem o mesmo devido ao fumo relacionado com a cozinha ou aquecimento. Doenças pulmonares, cardiovasculares e AVC, provocados ou agravados pela poluição, são os principais causadores destes números. E 91% das pessoas vivem em locais com uma concentração de elementos poluentes no ar acima do recomendado pela OMS, particularmente nas regiões menos desenvolvidas ou com maior pressão urbana e industrial.
A Qualidade do Ar é de extrema importância para uma vida saudável, mas também para a sustentabilidade de todo o planeta. Ao definir os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) para 2030, a Organização das Nações Unidas não inscreveu a Qualidade do Ar com um deles. A razão é simples: esta é uma questão transversal a vários ODS, sempre presente na estratégia de inúmeras metas. Saúde e Bem-Estar, Acesso à Energia, Cidades Sustentáveis, Alterações Climáticas e Parcerias Globais são os principais objetivos da ONU que incluem esforços para melhorar a Qualidade do Ar em geral e pelo combate à poluição, sejam as emissões de gases com efeito de estufa ou a presença de partículas poluentes na atmosfera.
Em 2018, o diretor-geral da OMS, Tedros Ghebreyesus, referiu-se à poluição do ar como “o novo tabaco”, definindo-a ainda como uma “emergência silenciosa de saúde pública”, à qual “ninguém, rico ou pobre, pode escapar”. E, mesmo que os efeitos da pandemia de Covid-19 tenham momentaneamente reduzido os níveis de poluição a nível global - e que nos tenhamos surpreendido com histórias de animais selvagens a circular nas cidades -, uma recuperação económica e industrial rápida de vários sectores pode ter, no imediato, efeitos ainda mais prejudiciais no ar que respiramos. Vale a pena lembrar que um dos artigos mais usados para combater a progressão da Covid-19 - a máscara de proteção - já faz parte do dia-a-dia de vários países há décadas, principalmente na Ásia.
A poluição atmosférica pode ter causas naturais, como os vulcões, incêndios florestais ou mesmo terramotos, que libertam partículas poluentes, mas são as pessoas que mais afetam a Qualidade do Ar, principalmente através dos transportes e de atividades agrícolas ou industriais, de acordo com a Agência Europeia do Ambiente. Por outro lado, a chuva e o vento alargam os efeitos da poluição, pela maior dispersão de partículas e os raios solares podem acentuar os seus efeitos.
Seja crónica, com pequenos efeitos prolongados no tempo, ou aguda, por concentrações muito elevadas e rápidas de poluentes num local específico, a perda de Qualidade do Ar é extremamente prejudicial ao equilíbrio da natureza. E os transportes convencionais, movidos a combustíveis fósseis, são dos maiores causadores de poluição, principalmente em zonas densamente povoadas.
Um euro perdido por cada duas pessoas
Segundo a OMS, os efeitos da poluição atmosférica na saúde obrigam a gastos públicos mundiais superiores a 4,33 biliões de euros todos os anos, o equivalente a mais de um euro por cada dois habitantes do planeta ou a um terço do PIB da União Europeia. A ONU destaca ainda que os 15 países com mais emissões de gases com efeito de estufa gastam 4% do seu PIB a enfrentar os impactos da poluição do ar.
Em Portugal e na União Europeia, apesar de a generalidade do continente apresentar uma qualidade do ar boa ou moderada, existem várias bolsas de poluição, particularmente no norte de Itália e no leste europeu. As dez cidades europeias com melhor Qualidade do Ar, segundo a Agência Europeia do Ambiente, situam-se quase todas em países do norte do continente. As exceções são o Funchal, na terceira posição - atrás de Umea na Suécia e Tampere na Finlândia -, e Salamanca, que está em 8.º lugar. No extremo oposto, a lista de 323 zonas urbanas cujos níveis de poluição são medidos regularmente é fechada com cinco cidades polacas, quatro italianas e uma croata. Nowy Sacz, no sul da Polónia, é a pior.
Quatro décadas de combate internacional
Foi em 1979, em Genebra, que 32 países assinaram a Convenção sobre a Poluição Atmosférica Transfronteiriça de Longa Distância (CLRTAP na sigla inglesa), sendo o principal tratado internacional que promove a Qualidade do Ar e regula a poluição. Promovida pela Comissão Económica das Nações Unidas para a Europa (UNECE), a convenção entrou em vigor em 1983 e, quatro décadas depois, é seguida por 51 países. O motivo inicial para este tratado foi a confirmação de que as partículas poluentes podem afetar regiões e países longínquos relativamente ao local onde foram libertadas ou causadas.
A CLRTAP tem vindo a regular os poluentes lançados na atmosfera e afirma que as reduções de emissões conseguidas por essa via baixaram 40% a 80% nalguns tipos, permitindo evitar 600 mil mortes por ano. Em 2019, aniversário da primeira convenção, foi assinada uma declaração que reafirma o compromisso em “reforçar a Qualidade do Ar, com o propósito de promover um ambiente melhor e reduzir impactos negativos na saúde humana”. Os objetivos até 2030 passam por:
- Maximizar o impacto da Convenção do Ar;
- Assegurar recursos para a sua monitorização e planeamento;
- Manter o foco nos poluentes melhor controlados a nível regional;
- Apoiar atividades científicas que ajudem a definir prioridades e decisões;
- Melhorar a cooperação entre diferentes governos e instituições;
- Promover uma abordagem ambiental, centrada na poluição do ar, na definição de políticas.
Na União Europeia, que representa a maioria dos países da Convenção do Ar, a poluição atmosférica também tem sido um foco cada vez maior de preocupação. A um primeiro pacote de medidas denominado ‘Ar Limpo’, posto em prática a partir de 2013, seguiram-se revisões da regulação e análise dos impactos das medidas. Mais recentemente, a propósito do Acordo Verde Europeu, a UE anunciou que poderá rever, em 2022, as diretivas sobre a Qualidade do Ar. A ideia base é que “o ar limpo é essencial para a saúde e para o ambiente”, ao mesmo tempo que o efeito positivo das medidas regulatórias na economia comunitária é muito superior aos custos para as implementar.
Transição energética é o caminho a seguir
Tal como noutras questões abordadas pelos ODS da ONU, a transição energética é uma das formas de combater eficazmente a poluição e reforçar a Qualidade do Ar, principalmente nas cidades. Esse objetivo deve ser conseguido pelos governos e pelas empresas, mas também pelos cidadãos, na definição das escolhas que fazem na sua casa e na sua vida.
Se os transportes são um dos maiores poluidores, a mobilidade sustentável é o caminho a seguir para melhorar a Qualidade do Ar que respiramos. Seja a troca do carro a gasóleo ou gasolina por um veículo elétrico, ou o uso de transportes públicos, carros partilhados e bicicletas, sem esquecer os percursos a pé, a redução da poluição beneficia tanto a nossa saúde como a de quem se cruza connosco.
A EDP está empenhada na neutralidade carbónica em todas as suas vertentes, tendo sido em 2018 um dos fundadores da Aliança para a Descarbonização dos Transportes, uma organização internacional que trabalha com o objetivo de levar esse sector às ‘emissões zero’ em 2050.
Desenvolver uma agricultura cada vez mais livre de poluentes, apostar numa indústria eficiente, e reforçar o peso e a diversidade das florestas e zonas verdes das cidades, são outros passos para a melhoria da Qualidade do Ar. Garantir um ar livre de poluição, que permita evitar problemas de saúde às pessoas e melhorar o equilíbrio dos ecossistemas, deve ser um esforço comum. Para que a sensação de ‘respirar ar puro’ não se limite às zonas protegidas e parques naturais, mas também ao centro das maiores cidades.