As renováveis são cada vez mais a resposta para a descarbonização. A eletrificação, aliada a tecnologias como a hibridização, a integração e, claro, o hidrogénio são palavras-chave para se conseguir a neutralidade carbónica
A União Europeia está comprometida em assumir a neutralidade carbónica até 2050, contribuindo assim para as metas globais e europeias assumidas no Acordo de Paris. Cada estado-membro apresentou a sua estratégia para cumprir essas metas e Portugal não foi exceção, com uma política energética ambiciosa e com um longo caminho a percorrer. Já a EDP ainda foi mais longe: comprometeu-se ser 100% verde até 2030, assumindo a liderança da transição energética.
Transição energética que já está em marcha, mas agora é tempo de a acelerar. Este talvez seja o maior desafio que os países europeus assumem desde sempre, um objetivo comum ao resto do mundo, que entrega à luz deste Acordo de Paris a sobrevivência do planeta, pelo menos na forma como o conhecemos. Descarbonizar é preciso, mas também muito desafiante. O setor energético pode ser uma das chaves para atingir estas metas. Mas como?
Eletrificar é um caminho
A estratégia ambiental depende muito do sector energético neste momento, principalmente o sector elétrico. “O mesmo sector que, há muito pouco tempo, era altamente penalizado do ponto de vista reputacional, porque era responsável efetivo pelas emissões de gases de efeito de estufa, mas sem grande alternativa de transição”, destaca Sara Goulart, responsável pela área do Ambiente e Clima na direção de Sustentabilidade da EDP, numa entrevista sobre as alterações climáticas que pode ser vista aqui. “E é muito interessante ver que hoje é um setor que, de repente, é capaz de ser uma solução, não só para nós, consumidores domésticos, mas para muitos outros setores que não conseguiam descarbonizar, que ainda não tinham encontrado forma de o fazer”. Exemplos desses setores são os transportes, os edifícios, o setor comercial - que pode ser todo descarbonizado - e uma parte significativa da indústria”. Tudo isto, devido ao importante papel, sempre em crescendo, que as energias renováveis têm tido.
Algumas fontes de energias renováveis são, já hoje, mais económicas do que os combustíveis fósseis. No imediato, há então que aumentar exponencialmente a energia solar, eólica e outras fontes de energia limpa, minimizando o uso de combustíveis fósseis nesta transição energética. Mas para isto é preciso mais ação legislativa, programas de incentivo a projetos de eletrificação e também mais regulatórios, no sentido de se ir eliminando os combustíveis fósseis desta equação.
No imediato, as mudanças podiam começar pelo sector dos transportes, com a propagação dos veículos elétricos. Também no sector dos edifícios e da indústria, o recurso a painéis fotovoltaicos, a bombas de calor e a sistemas de aquecimento elétrico são passos assertivos a caminho da eletrificação, setores estes que Sara Goulart referiu como os mais passíveis de uma descarbonização imediata.
Feitas as contas, de acordo com o relatório Sector Coupling in Europe: Powering Decarbonization, a eletrificação destes três sectores pode reduzir as emissões de dióxido de carbóno (CO2) até 60%, entre 2020 e 2050. Esta revolução pode acontecer com mais uma adição de extrema importância, o tão falado hidrogénio verde (link para o artigo do hidrogénio), produzido por eletrólise usando para isso as energias renováveis. Reconhecendo-se hoje que a eletrificação por si só não consegue dar resposta a todo o consumo existente, será preciso integrar o hidrogénio nesta estratégia. Com efeito, o hidrogénio pode desempenhar um papel-chave na descarbonização de muitos setores. Como adianta João Nicolau, Hydrogen projects head da EDP, “o H2 e a eletricidade, mais do que concorrentes diretos, no futuro, tenderão a ser complementares, pelas suas características e aplicações distintas”.
Eólica offshore na ordem do dia
O investimento em energias renováveis nos últimos anos, permitiu ao setor da energia procurar por soluções mais eficientes, mais baratas e mais fiáveis. E aqui a energia eólica foi a que mais cresceu, não só quantitativamente, mas também qualitativamente. Além de ter atingido, nestas duas últimas décadas, os 370 GW de produção mundial acumulada, a eólica é hoje muito mais tecnológica. Soube acompanhar a evolução da tecnologia para produzir mais e a menor custo, mas também de forma mais eficiente e sustentável.
A produção de eletricidade a partir da força do vento cresceu não só em terra, como também se desenvolveu no mar (offshore), onde tem tido um crescimento exponencial no sector energético: cerca de 30% por ano na última década. Também os custos alocados a esta forma de energia, bem como a todas as renováveis no geral, têm descido drasticamente, colocando-as num patamar mais competitivo e acessível.
Assim, ao mesmo tempo que se continuam a instalar parques eólicos em terra, a tecnologia que permite a sua instalação no mar desenvolve-se cada vez mais. Porquê e que vantagens traz? “O primeiro benefício é que no mar consegue-se ter unidades de muito maior dimensão, ao passo que em terra há desde logo uma limitação muito importante: o tamanho das pás, com acesso condicionado de meios pesados ao local de instalação. Em terra falamos de turbinas de, no máximo, 4-5 MW de potência. Enquanto que para offshore já há turbinas de 12 MW e planos para turbinas de 15MW de potência”, começa por explicar Miguel Marques, líder da área de desenvolvimento de negócio do NEW.
Ao mesmo tempo, o vento no mar é mais estável, porque não tem ruído de proximidade à sua passagem. O vento deteriora-se à medida que passa por prédios, árvores e outros obstáculos, perturbações que não existem no mar. “No total, fazendo as contas, a eólica offshore continua a ser mais cara, porque no mar tudo é mais caro, seja os meios marítimos, a manutenção - que obriga à criação de novas tecnologias para se fazer remotamente, através de soluções robotizadas -, mas no custo-benefício a offshore começa a tornar-se cada vez mais interessante, quando comparada com a eólica em terra”, assume o especialista do EDP NEW.
Esta é uma tecnologia presente, sobretudo, no Mar do Norte, cuja área costeira permite instalar as turbinas eólicas em leito marítimo, porque a profundidade da água não ultrapassa os 40 metros. Na costa marítima do Atlântico, a profundidade está na ordem das centenas de metros, o que não permite o investimento nesta forma de eólica. Para colmatar esta dificuldade, apostou-se no eólico flutuante. O WindFloat foi a forma inovadora encontrada pela EDP para permitir a exploração do potencial eólico no mar, em profundidades (muito) superiores a 40 metros. Através de uma plataforma flutuante que suporta as turbinas eólicas multi-MW em aplicações marítimas, o WindFloat já é um caso de sucesso, encontrando-se em geografias específicas, como é o caso de Portugal, mas também na costa leste dos Estados Unidos ou nos mercados asiáticos do Japão e da Coreia. “Recentrando novamente aqui a tecnologia, o que temos procurado agora são soluções inovadoras interessantes para o eólico offshore flutuante para que se consiga demonstrar que são soluções possíveis para o futuro”, prossegue Miguel Marques.
Hibridização: outra das tendências atuais
Na transição energética e no papel que as energias renováveis têm para alcançar a neutralidade carbónica, é na diversidade que encontramos o equilíbrio para as soluções mais viáveis e eficientes. O termo hibridizar, que procura essa mesma diversidade no sector energético, nunca como hoje fez tanto sentido, na complementaridade de várias fontes de energia renovável, sobretudo, da solar e eólica. Ou seja, se num dia sol e de menor vento tiramos o máximo partido dos painéis fotovoltaicos, o mesmo já não acontece num dia chuvoso, ventoso ou muito nublado: num dia assim, já podemos retirar o proveito máximo do eólico.
É nesta soma, solar+eólica, que encontramos o resultado da hibridização. Mas há outras renováveis que podem ser combinadas, como a hídrica+eólica, por exemplo, desde que se consiga uma maximização da potência total instantânea entregue à rede elétrica. De acordo com as condições climatéricas e as possibilidades de uma região, é possível instalar e combinar as melhores renováveis para se retirar dali o melhor rendimento.
Assim é o conceito dos painéis fotovoltaicos no mar - em mares de água controlados, como lagos e albufeiras e não em mares abertos, sujeitos às intempéries dos oceanos -, que resultou na nova central fotovoltaica flutuante no Alto Rabagão ou em Alqueva. “Este vai ser um sistema com várias tecnologias diferentes de geração, em que o principal desafio é operá-las em conjunto e hibridizá-las”, destaca Miguel Marques. Ou seja, é um sistema que prevê a combinação de energia de várias fontes renováveis com a eletricidade de centrais convencionais.
Mas como? Através da integração de painéis solares no ecossistema do aproveitamento hidroelétrico do Alqueva, a que se junta uma unidade de armazenamento eletroquímico. A ideia é que este sistema opere como se fosse uma só central, maximizando a produção. “Todas estas unidades são descarbonizadas e aqui o objetivo é a otimização dos recursos, utilizando ao máximo a produção gerada pelos painéis fotovoltaicos, armazenando-a se for necessário, e utilizando ainda da melhor forma a água que está na albufeira para turbinar na central”, afirma o especialista do EDP NEW. Ou seja, o que fazer e como explorar as complementaridades na eólica - em que a velocidade do vento é superior à noite, ao passo que o solar fotovoltaico só produz durante o dia -, “é um trabalho que a EDP tem vindo a explorar”, reforça Miguel Marques.
Nas centrais equipadas com máquinas reversíveis é ainda possível utilizar a energia excedentária através da bobagem. Ou seja, a energia que não seja utilizada pelos consumidores é aproveitada para mover as turbinas no sentido inverso e assim volta a encher as albufeira de água, que ficará armazenada até haver um novo aumento do consumo elétrico. Na Península Ibérica, a EDP já utiliza este recurso em mais de 40% das barragens.
A EDP e as renováveis
Neste campo, Portugal até é um dos países que consegue partir em vantagem, já que tem uma paleta de energias renováveis que outros não têm e, com isso, pode acelerar a eletrificação da economia. Mas há outras geografias bem posicionadas para conseguir esse fim. Também o Brasil, onde a EDPR opera desde 2009, se prepara para construir até 2023 mais oito complexos eólicos e solares, contando já com uma percentagem muito elevada de energias renováveis, em que se destaca a hídrica. Já os Estados Unidos, mercado que a EDPR começou a explorar em 2007, são o principal mercado em termos de capacidade instalada e produção de eólica, alinhado com o novo compromisso de Joe Biden. De resto, também em toda a Europa em que a EDPR está presente, como a Espanha, a França, a Bélgica, a Grécia, a Hungria, a Itália, a Polónia, a Roménia ou o Reino Unido, tem desenvolvido progressos assinaláveis a nível das renováveis. Importa ainda salientar que são os países europeus que melhor posicionados estão para atingir o objetivo da neutralidade carbónica, ocupando os lugares cimeiros no ranking dos países menos poluentes.